domingo, 13 de junho de 2010

Iguais

O rapaz e a rapariga estão como Cristos na cruz. Aquela versão contemporânea de “Romeu e Julieta” que abriu o Festival de Sintra começa pelo fim, a morte. É no final, mas é o princípio de tudo.

Não foi uma epifania porque já sabia, mas é fatal o poder de revelação de uma coisa que andava, subterrânea, a chatear o juízo. Foi assim, a assistir ao ballet, que soube e comecei a querer assumir que sabia. Que o amor deve ser aquele momento em que nos encontramos a metade do caminho. O amor deve ser aquele instante em que somos iguais. Não é o tempo em que cedemos ou relevamos, isso é sobrevivência. Naquele momento acho que compreendi. O amor deve ser aquele trajeto, que pode ser minúsculo, que percorremos lado a lado. Sim, nas relações amorosas há assimetria e défice democrático na maior parte do tempo. Mas o amor não é isso.

A juventude e, principalmente, a fragilidade daquele Romeu e Julieta estão ao serviço da igualdade fundadora. Por isso é que aqueles bailarinos foram um milagre de “casting”, porque não são apenas bons, são franzinos e indefesos. E são os dois assim. No “Romeu e Julieta” clássico que vi centenas de vezes em VHS, Alessandra Ferri era o corpo de menina perfeito para significar a troca que só se dá na igualdade, mas o bailarino era robusto de mais, ou assim me pareceu na altura, impressionada, como sempre, por aquelas protuberâncias inferiores. Talvez já estivesse tudo no texto, mas só nos corpos é que eu o vi. Está tudo no Shakespeare, claro. A determinada altura o Romeu sobe a varanda, não é? Ficam ao mesmo nível. E morrem juntos, aquele fim que todos os amantes querem. Querem-no longínquo, se não forem loucos, mas querem-no um dia. Para serem, uma última vez, não um, mas iguais.

5 comentários:

  1. (fico-me mudo, a beber as palavras - belíssimas... "Querem-no longínquo, se não forem loucos, mas querem-no um dia. Para serem, uma última vez, não um, mas iguais.")

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  2. Acho que corei com o elogio. Obrigada. Tudo de bom, para ti e para as meninas. :)

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  3. Sou tão orgulhosa de te ter por perto,sempre com palavras que conseguem traduzir com execelência o que sentimos e não sabemos dizer.E aí vem você e escreve e faz como esses bailarinos fizeram com a dança,faz parecer que é fácil! Parabéns! :)

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  4. Serem iguais e não um só não deve ser mais fácil, mas pelo menos mais cabível, pois é um esforço mais possível de ser realizado. Acho eu, mas não entendo nada disso.

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  5. Nesta matéria, nunca se entende muito, querida Marina... Mas a igualdade parece-me preferível à unidade, sim. Mas isso sou eu, que acredito na preservação da individualidade, como um bom princípio para muita coisa.:)

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