O José Luís Peixoto sabe escrever sobre terrinas a despedaçarem-se. Terrinas com rosas na tampa, terrinas que
acumulam coisas lá dentro, porque são de enfeitar, de estar no centro das mesas
todos os dias. As terrinas sem sopa que se compram na feira da Luz e antes
pergunta-se “é a quanto?”. Não sei quando foi a última vez que li na minha língua
uma coisa assim. Li noutras. Vem-me à cabeça a Toni Morrison, em “Beloved”, e
talvez tenha pouco a ver, mas é o que me lembro. Li noutras línguas. Mas é na
materna que consola. Ou escacava tudo à frente? É na materna que mais espanta,
será? Não é a mesma coisa ler do inglês ou ler na língua mãe sobre um pai que
chega da taberna cambaleante, um pai que parte os pratos da sopa ou a terrina
sem sopa. E as alegrias de se surpreender uma cadela a parir cãezinhos dentro de um piano numa
oficina em Benfica. E o cheio de quando se mata uma galinha. O cheio aquoso de quando
está quase, a ânsia cansada de uma canja.
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