Henriett Ventura e Carlos Pinillos, em "Pedro e Inês", de Olga Roriz, para a Companhia Nacional de Bailado. Fotografia de Bruno Simão
Orgulho-me tanto da minha
memória. Que arrogância. Afinal, há 12 anos Ana Lacerda era Inês morta e o que
me comoveu às lágrimas foi esse pas de deux com Christian Schwarm. A Inês que
ama Pedro na água é interpretada por uma bailarina diferente da Inês morta. A mulher
desdobrada em sentido inverso dos dois cisnes. Em “O Lago dos Cisnes” o cisne
negro e o cisne branco são dois e sempre a mesma bailarina.
A procura da unidade continua a
virar-me para Tatiana e o bailado que mais vi mas nunca ao vivo. Em “Oneguin” há
uma mulher que chega à cena final no mesmo corpo, da mesma bailarina. Tatiana é
a mesma. Seria condescendente dizer que é outra porque põe Oneguin porta fora quando
ele lhe aparece velho mas com os mesmos truques que na juventude conduziram a
duelos ao frio e toda a sorte de sarilhos, morte e destruição. Tatiana de dedo
estendido a apontar a Oneguin a rua é um comovente gesto de autopreservação tardio.
Pode aparecer como a única atitude inteligente de Tatiana, que passa quase todo
o bailado entregue à fragilidade de menina, mas só para quem escolha ignorar o
salto temporal em que Tatiana se desdobra e cresce longe do espectador. Ela é
a mesma porque é outra. É esse o seu propósito, que é tão mais claro quanto
posto em contraste com a imaturidade de Oneguin, tornada patética pelo passar
do tempo. Respeitemos a heroína romântica, ela merece.
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