segunda-feira, 19 de outubro de 2015




Henriett Ventura e Carlos Pinillos, em "Pedro e Inês", de Olga Roriz, para a Companhia Nacional de Bailado. Fotografia de Bruno Simão



Orgulho-me tanto da minha memória. Que arrogância. Afinal, há 12 anos Ana Lacerda era Inês morta e o que me comoveu às lágrimas foi esse pas de deux com Christian Schwarm. A Inês que ama Pedro na água é interpretada por uma bailarina diferente da Inês morta. A mulher desdobrada em sentido inverso dos dois cisnes. Em “O Lago dos Cisnes” o cisne negro e o cisne branco são dois e sempre a mesma bailarina.

A procura da unidade continua a virar-me para Tatiana e o bailado que mais vi mas nunca ao vivo. Em “Oneguin” há uma mulher que chega à cena final no mesmo corpo, da mesma bailarina. Tatiana é a mesma. Seria condescendente dizer que é outra porque põe Oneguin porta fora quando ele lhe aparece velho mas com os mesmos truques que na juventude conduziram a duelos ao frio e toda a sorte de sarilhos, morte e destruição. Tatiana de dedo estendido a apontar a Oneguin a rua é um comovente gesto de autopreservação tardio. Pode aparecer como a única atitude inteligente de Tatiana, que passa quase todo o bailado entregue à fragilidade de menina, mas só para quem escolha ignorar o salto temporal em que Tatiana se desdobra e cresce longe do espectador. Ela é a mesma porque é outra. É esse o seu propósito, que é tão mais claro quanto posto em contraste com a imaturidade de Oneguin, tornada patética pelo passar do tempo. Respeitemos a heroína romântica, ela merece.

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