quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

em diferido


Denzel Washington e Viola Davis em "Fences", de Denzel Washington, a partir da peça de August Wilson


Tinha 12 anos e vi a entrega dos óscares pela primeira vez. Foi em diferido e na versão resumida que as televisões emitem (ainda emitem?) na noite seguinte. Como todas as coisas que sabia, pressentia ou queria que fossem especiais, gravei. A cópia VHS dos óscares de 1992 ainda deve existir, detrito a boiar no mar acumulativo da casa da minha mãe. Precisamente, não é lixo, é tesouro.
 Foi o ano do “Silêncio dos Inocentes”. A Jodie Foster apareceu divina num conjunto pérola, casaco e calças cigarro, cabelo em ondas ligeiras, a acenar de longe aos anos 1930, profundamente ‘lesbian chic’, sei-o hoje. Foi também o ano das flexões de Jack Palance ao receber o prémio por “A vida, o amor e as vacas”, humor de cowboy, a gargalhada mesmo no centro do american way of life. O Billy Cristal foi o anfitrião, a fazer rir dentro daquela correção das coisas mesmo boas do ‘showbiz’: estão lá como monumentos para adoração, não falhando na concessão de graças.
Nesse ano percebi que havia muitos bons filmes para ver. Foi o ano de “O príncipe das marés”, “O Rei pescador”, “JFK” (falha até hoje), “O cabo do medo”. Já chega? Não. Foi também o ano de “Thelma e Louise” (marca a ferro em brasa, sempre renovada), “Bugsy”, “Bela e o Monstro”. A Liza Minnelli e a Shirley MacLaine apresentaram o óscar de melhor canção. Demi Moore pisou o palco do alto da sua roquidão, abençoada seja a categoria de melhor guarda-roupa. O Paul Newman e Elizabeth Taylor abriram o envelope para o melhor filme, por amor de Deus.
A 64ª cerimónia de entrega dos óscares não foi um espetáculo, foi uma conspiração para comandar o meu comportamento entre dezembro e fevereiro para o resto dos meus dias. Podia lamentar como nada já não é como dantes, mas isso era negar o que aquela noite diferida fez de mim. E este ano, há tantos bons filmes a honrar aquela noite de feitiço certeiro.

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